quinta-feira, dezembro 20, 2007

PASSEANDO POR CAMBRIDGE NUM DOMINGO COM O NATAL À PORTA:
  • Perto de Christ's Pieces, um pai de família que devora uma salsicha no pão vê-me a comer uma banana, e comenta «Taken the healthy choice?».
  • Um saxofonista interpreta um tema de Norah Jones, perto da entrada do Boots, ofuscando as mini-filarmónicas que povoam as ruas mais concorridas do centro da cidade.
  • Na livraria Borders, uma mulher, ao telefone, pergunta «How much into architecture is he?». A resposta parece ter sido categórica, e a pessoa em questão (que espero não seja leitor deste blog) pode contar com um livro sobre as "Houses of Parliament" no sapatinho.

sexta-feira, dezembro 14, 2007

LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS: No comboio Cambridge-Londres, uma jovem lia "The Crying of Lot 49", de Thomas Pynchon.


Pelo menos durante uma manhã, o sinistro segredo de Trystero pairou sobre as estações de Foxton, Shepreth, Meldreth, Royston, Ashwell & Morden, Baldock...


segunda-feira, dezembro 10, 2007

FINGERLESS, LAMBSKIN, LEATHER, STRIPED, FLEECE, AMBIDEXTROUS: Este site propõe-se reunir luvas perdidas na cidade de Pittsburgh, Pennsylvania, com os legítimos donos. Ou, mais exactamente, com as mãos geladas que tanto sentem a falta do artigo perdido. Há dias, encontrei um par de luvas num autocarro. Curiosamente, pareciam-se muito com estas. Não preciso de muito mais para acreditar num sinal do destino. Talvez a minha razão de ser e de estar no mundo tenha a ver com luvas. O meu destino não é loquaz. O meu destino é taciturno e lacónico, e esta seria uma preciosa ocasião para que o meu destino mudasse de atitude.

sábado, dezembro 08, 2007

LE POINT CENTRAL EST PRÉCISÉMENT LE SENTIMENT DE L'ÊTRE: «Au temps où j'écrivais la seconde et la troisième partie de ce livre, il m'est souvent arrivé de me répeter silencieusement ou à mi-voix à moi-même: «Zénon, Zénon, Zénon, Zénon, Zénon, Zénon...» Vingt fois, cent fois, davantage. Et sentir qu'à force de dire ce nom un peu plus de réalité se coagulait.» Isto escreve Marguerite Yourcenar no "Carnet de notes de L'Oeuvre au Noir". Como se fazer existir no mundo a sonoridade das sílabas do seu nome conferisse a uma personagem a sua legitimidade. Mais ainda: a sua inevitabilidade, um travo a facto consumado que consagra a responsabilidade do autor, para quem o retrocesso deixa de ser possível. Esta repetição é mais do que um mantra: é um salto no vazio, uma abdicação do direito a não criar. Mais do que criar um vínculo, o acto de nomear faz parte do vínculo.
LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS: No cinema Arts Picture House, de Cambridge, um jovem lia um livro de V.S. Naipaul. Sentou-se, tal como eu, na 3ª fila da plateia, não sei se por gostar de estar perto do ecrã, ou simplesmente por ser um lugar com iluminação suficiente para continuar a ler o seu livro antes do início do filme ("The Darjeeling Limited", Wes Anderson).

segunda-feira, dezembro 03, 2007

INITIATED INTO AN ORDER OF EXILES:



Os telhados de Paris, modo de usar; ou, Rivette em Cambridge; ou ainda, Trata Bem A Tua DVDteca E A Tua DVDteca Tratará Bem De Ti.
LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS: (Neste caso, as minhas.) Lembro-me de ler que Marguerite Yourcenar declarou que preferiria uma morte lenta, para sentir o processo entranhar-se dentro de si. Foi impossível não recordar esta citação (talvez deturpada) ao ler o relato da morte auto-infligida da personagem Zénon, que encerra o romance "L'Oeuvre au Noir". Ainda estou na dúvida sobre se essas páginas tão singularmente lúcidas e serenas, mas também brutais, ganharam ou perderam intensidade ao serem lidas no piso superior de um autocarro da carreira "Citi 1", a caminho do centro de Cambridge, sacudido pelos solavancos do tráfego que faziam oscilar ruidosamente uma garrafa de "Dr. Pepper" abandonada no chão. Ao meu lado, esquecido sobre um banco, um par de luvas que entreguei ao condutor antes de sair. A vida, fazendo-se lembrada com bem-humorada prepotência?