segunda-feira, fevereiro 28, 2005

ANÚNCIOS DE GATO PERDIDO INVENTADOS (8):
Perdi gato Quero gato Dou dinheiro a quem me der gato Dinheiro é bom Com dinheiro compram-se coisas Bijuteria em ouro De raro quilate Trajos debruados Regalo para vista e tacto Gato é bom Tem narinas, garras e mia Enfim é gato Também tenho lindas noivas da Ucrânia Discrição total garantida Gato ronronava como um fole Perdi-o e pronto Cabe um gato enroscado no colo das noivas ucranianas Eslavas interjeições de ternura polvilham a interminável noite

domingo, fevereiro 27, 2005

DE ENVELOPES E BOCADOS DE METAL: E eis que se repete o ritual dos óscares, com as inevitáveis colateralidades sob a forma de especulações, graçolas asininas, toilettes hediondas e pseudo-controvérsias. Dizer mal dos óscares, neste blog, transformou-se já numa pequena tradição. Compreendo mal o interesse dedicado a este evento de auto-celebração de uma indústria, onde acabam sempre, salvo raras excepções (e as excepções são amiúde mais reveladoras do que a regra, neste caso), por ser premiados o conformismo e o respeito pelos cânones. Tal como sucede com tantos outros prémios de prestígio, em diversas áreas (estou a pensar no Nobel, no Goncourt...), os óscares souberam dotar-se de um poder auto-legitimador que dispensa considerações sobre a competência e a idoneidade de quem os atribui. Um óscar é UM ÓSCAR, e ponto final parágrafo. Mas um óscar é muito mais do que um prémio: é uma marca registada que também serve como elemento na cadeia de promoção comercial de um filme. Dedicar às estatuetas douradas mais do que uma referência en passant, num órgão de comunicação social, implica conivência com essa situação, nos limites entre o reconhecimento da excelência artística e a propaganda.
PARIS: «...car les idées, à Paris, sont dans l'air, elles vous sourient au coin d'une rue, elles s'élancent sous une roue de cabriolet avec un jet de boue!» (Honoré de Balzac, "La Muse du Département", LIII)
LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS: Na estação de metro do Saldanha, vi mais um cidadão entretido com um livro de José Gil. Medo de existir, talvez. Medo de ler, nunca!

quinta-feira, fevereiro 24, 2005

MITOS URBANOS (1): O sucesso de um mito urbano joga-se no improvável terreno de intersecção entre o inverosímil e a comodidade doméstica da narrativa. Para que ganhe aceitação, é necessário que reúna duas condições quase incompatíveis: deve, por um lado, conter uma parcela de escabroso, um insulto latente à tepidez do quotidiano; e, por outro, deve ser domesticável sob a forma de uma narrativa, capaz de ser acolhida na matriz de ficções que constitui o tecido das vivências e especulações humanas. Gerar e propagar um mito urbano é tarefa de elevada dificuldade. Basta experimentar para se ficar com a certeza disso. É requerida imaginação. É requerida experiência. O acesso a uma amostra de população atenta e móvel é condição necessária. Não é indispensável um plano, um propósito. Pelo contrário. O sucesso premeia o desprendimento. Na rua, à tardinha, as pessoas cujo caminhar apressado se observa à altura dos tornozelos não adivinham aquilo que as espera para o dia seguinte. Os tempos estão perigosos.
DO QUE SE NUTRE A GRANDE LITERATURA: Uma das personagens do romance "La Muse du Département", de Balzac, sustenta que, excepção feita à "Histoire des Variations" de Bossuet, e às "Provinciales" de Pascal, nada restaria da literatura, se dela se extirpassem as obras que tratam do adultério («...où il est question de femmes aimées à l'encontre des lois.»). E menciona "Tartuffe", "L'École des Femmes", "Phèdre", "Andromaque", o "Inferno", os sonetos de Petrarca e a história romana, e até mesmo o "Paraíso Perdido" e os salmos de David! E contudo, contudo, quando escutamos o Prof. João César das Neves, ficamos convencidos de que o adultério só passou a existir na nossa sociedade obcecada com o prazer após as libertinagens de Maio de 68 e os desmandos do Concílio Vaticano II. Antes disso, imperava a harmonia conjugal universal. Em quem acreditar? O que faz a polícia?
AO QUE ISTO CHEGOU: A estação de metropolitano Roma encontra-se num estado deplorável: graffiti velhos de anos (se não de décadas), obras que se arrastam, canais de acesso avariados, iluminação escassa, desleixo geral, aspecto lúgubre. Na minha qualidade de utente regular, que paga o seu passe de 30 dias e que em troca espera um serviço de qualidade, sinto-me no dever e no direito de protestar. Se existe correlação entre esta situação e o descalabro moral da nação, cabe a espíritos mais esclarecidos do que eu indagar. Mas lá que existe concomitância temporal, existe. (NOTA: Isto não é um pastiche de carta a director de jornal de freguesia.)

quarta-feira, fevereiro 23, 2005

THE EMPEROR'S NEW CLOTHES: Este blog está agora instalado aqui, consumou-se a mudança de entidade albergadora. Porém, devido a condicionalismos transientes de ordem informática/logística, o ritmo de publicação não deverá recuperar a vivacidade d'antanho antes de algumas semanas. Gratos pela paciência. Ah, e, caso notem problemas no template, etc., ficarei reconhecido se tiverem a fineza de mo comunicar por e-mail (ver coluna da esquerda), viva voz, ou estreita tira de papel glorificada com cursivo minúsculo e enrolada em pata de pombo.
POLÍTICA EDITORIAL: Leia o 1bsk, o único blog do mundo que reconhece não ter nada a dizer de relevante sobre seja o que for, mas que procura dizer o irrelevante com uma prosa que cruza Camilo com Luiz Pacheco!
LE FOND DE L'AIR EST ROUGE: A Fábrica de Chaves do Areeiro oferece uma vasta gama de artigos, entre os quais fechaduras sem cilindro, de duas ou quatro trancas, com chave tipo "cofre", fechaduras de alta segurança eléctricas em dois pontos, sem cilindro, com chave telescópica, e uma super porta blindada com fechadura de alta segurança, visor panorâmico de 180 º, dobradiças especiais, aros em aço, estrutura com secção rectangular de aço, e folheado em contraplacado de mogno. Nenhum pai de família deve dispensar equipar-se com estes dispositivos, agora que os trotskistas estão apenas a um por cento dos democratas cristãos. Protejam os vossos bens!

segunda-feira, fevereiro 21, 2005

CHUVA, CHUVA, CHUVINHA...: Em Fátima, reza-se para que a chuva chegue, por fim. Acho sempre instrutivo constatar como a Igreja se permite deixar fugir o pé para a chinela do paganismo, quando tal lhe convém. A chuva é, decerto, objectivo mais aliciante e vendável do que a salvação eterna ou a virtude cristã. Quando as primeiras gotas caírem, não faltarão as vozes para sugerir uma intercessão da Virgem Maria. Nem de outro modo funcionam os ritos de fertilidade. O modus operandi e a eficácia estão comprovados há vários milénios.
UMA BRECHA NO CINISMO: A mulher da Cova da Moura que chorava por causa da morte do agente da PSP. Nem por afinidade familiar nem desgosto por via do genérico estado das coisas: mas porque "ele também era filho de alguém". Esta brecha no cinismo nosso de cada dia fez-me recordar que há poucas coisas mais nobres do que a compunção pela dor alheia.

quarta-feira, fevereiro 16, 2005

PROCURA-SE SERVIÇO PÚBLICO DE TELEVISÃO: Estou a assistir ao oportunista documentário da RTP1 sobre Fátima. Uma só palavra: desastroso. A perspectiva céptica e crítica não é minimamente tida em conta. O documentário parte do princípio de que as aparições sucederam, e preocupa-se mais em narrar o lento despertar das hierarquias católicas para o interesse de anexar Fátima à sua doutrina do que em procurar respostas para a questão "o que se passou ao certo na Cova da Iria entre 13 de Maio e 13 de Outubro de 1917?". Poderá ser alegado que não era esse o objectivo do documentário. Mas como é que uma peça jornalística sobre um fenómeno com tão forte impacto se pode furtar a dar voz a uma abordagem céptica e indagadora? No mínimo, as opiniões de um especialista em psicologia de massas seriam fortemente bem-vindas. Deplorável, mas previsível. O rol de razões para ler o Diário Ateísta alonga-se de dia para dia.

terça-feira, fevereiro 15, 2005

O SEU A SEU DONO: Na Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro, os DVDs dos filmes "Os Idiotas" (Lars Von Trier) e "Conto de Verão" (Éric Rohmer) encontram-se classificados na secção "comédias". A Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro fica situada no antigo Solar da Nora, Estrada de Telheiras, Lx. Será a divisão em géneros uma mera e conveniente invenção da indústria cinematográfica? Sinto vontade de rever "Conto de Verão", mas também de o ver pela primeira vez. Sinto vontade de comer uma "galette de sarrasin" com manteiga bretã salgada.

segunda-feira, fevereiro 14, 2005

LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS: Na estação de Campanhã, um moço lia uma obra de José Gil. A atenção denunciada pela postura física justifica os cinco pontos de bónus.