quinta-feira, outubro 27, 2005

SUPÉRFLUO MAS NÃO ISENTO DE LIRISMO: Consultando uma enciclopédia da vida animal, inteiro-me da existência de três espécies de gansos-patolas: o ganso-patola-de-patas-azuis, o ganso-patola-pardo e o ganso-patola-comum. Destes, só o último se encontra nas costas portuguesas, tendo saído recentemente de um injusto anonimato por mor da ameaça do vírus H5N1.
SMELLS LIKE TEEN SPIRIT: Graças ao IMDB, fico a saber que o filme "Last Days", de Gus Van Sant, recebeu classificação etária de Maiores de 16 na Suíça, tanto no cantão de Genève como no cantão de Vaud. O meu sentimento de alívio foi indescritível, pois parecer-me-ia difícil de admitir e atentatório à unidade nacional que este tipo de classificações variasse de cantão para cantão.
A BALADA DA BARATA SALGUEIRO: Amanhã (ou melhor, hoje), quinta-feira, às 22h, passa na Cinemateca "O Bobo", fabulosa obra-prima de José Álvaro Morais. A Cinemateca nem fica longe da Rua Alexandre Herculano, e que agradável que é quando a toponímia e a cinefilia andam de braço dado.
TEORIA E PRÁTICA: Um lema deste blog é o seguinte: um por cento de inspiração, um por cento de transpiração, e noventa e oito por cento de conspiração.
STRAWBERRY FIELDS FOREVER: No episódio de hoje dos "Morangos com Açúcar", fez-se história quando a Matilde recorreu ao seu blog para se defender perante a irmã (Beatriz) da acusação de lhe ter roubado o namorado. Sou forçado a concluir que tenho menosprezado injustamente esta série. A única coisa que posso provar aos incrédulos com recurso ao meu blog é que perco o meu tempo a redigir anúncios de gato perdido inventados, em vez de me lançar em empreitadas proveitosas para o país e a humanidade em geral.

terça-feira, outubro 25, 2005

EXCURSIONISMO PICTÓRICO (0)*:

Frans Hals, "Young Man Holding a Skull (Vanitas), 1626-8

Escreveu Vincent van Gogh a propósito de Hals: «(...)heads too - eyes, nose, mouth done with a single stroke of the brush without any retouching whatever... To paint in one rush, as much as possible in one rush... I think a great lesson taught by the old Dutch masters is the following: to consider drawing and colour one.»

Não só concordo, não só aprovo, como considero que Van Gogh colocou aqui o dedo na ferida com uma típica acuidade. (Continua.)

*Título provisório.

MISSÃO: RECUPERAÇÃO DO TEMPO PERDIDO (3): Neste espaço, já tive o prazer de anunciar o nascimento de muitos blogs, de diversíssimas naturezas. É, julgo-o, compreensível que o prazer seja redobrado quando se trata de anunciar o nascimento recente dos blogs do meu pai e do meu irmão. É bem certo que isto pode ser considerado nepotismo, mas espero que, a haver uma Alta Autoridade contra estas coisas, Ela feche os olhitos por uma vez.
LEITURAS: Nas "Metamorfoses" (livro XIV), Ovídio conta a história da Sibila, que, por ter prestado serviço inestimável a Eneias (ao indicar-lhe a maneira de visitar o reino dos mortos), recebe deste a promessa de um templo e de um tributo de incenso. A Sibila recusa tal oferta, por não possuir estatuto divino. Mas acrescenta (em tom de desabafo amargurado demasiadas vezes reprimido) que poderia ter-se tornado uma deusa, se tivesse feito a Apolo, que outrora a amou, o dom da sua virgindade. Como Apolo lhe concedera qualquer desejo que a Sibila formulasse, ela pediu-lhe que a deixasse viver tantos anos quantos os graus de poeira contidos numa mão cheia. Porém, esqueceu-se de pedir também a eterna juventude, o que a levou a definhar, ao longo dos setecentos anos seguintes, até a um estado de decrepitude humanamente inimaginável. Ainda assim, Apolo ter-lhe-ia concedido que conservasse o viço da juventude, se a Sibila lhe oferecesse o seu amor. Mas esta recusou. Perante Eneias, queixa-se de que virá o tempo em que o seu corpo acabará reduzido a um peso insignificante. O próprio Apolo não mais a reconhecerá, ou então negará alguma vez tê-la amado. Porém, mesmo quando mais ninguém a puder ver, de tão minguada, os destinos deixar-lhe-ão a voz, pela qual continuará a ser recordada. E é este último desejo que me faz acrescentar a Sibila ao meu rol de vozes descorporizadas. (Curiosamente, este episódio não consta da Eneida, se bem que Ovídio seguisse a tradição Virgiliana de forma bastante próxima.)
LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS: Um jovem lia "A Mãe", de Gorky, enquanto caminhava, absorto, junto ao muro do Museu da Cidade, ao Campo Grande, expondo-se ao risco de tropeçar na cauda multicor de um pavão, também ele multicor. A quem deverei telefonar, caso me cruze com um pavão engripado? Ao Ministério da Saúde? E se for fora do horário de expediente? Nada disto, bem entendido, tem a mais leve relação com Gorky, romancista russo (1868-1936) que é considerado um dos fundadores do realismo soviético.

quinta-feira, outubro 20, 2005

SANTOS E PROSADORES: Graças ao Diário Ateísta, fico a saber que o cardeal Newman vai ser elevado a santo. Associo esta personalidade, antes de tudo o mais, a James Joyce, que tinha em altíssima conta a prosa deste inglês convertido ao catolicismo. Joyce escreveu: «I have read him a great deal... [in 'Oxen'] where all the other authors are parodied, Newman alone is rendered pure, in the grave beauty of his style. Besides, I needed that fulcrum to hold up the rest... The Church will surely decide to make a saint of him, if only for the numerous conversions that have followed in the wake of his own. At least a Blessed, if they don't succeed in finding a miracle.» ("Oxen" refere-se a um dos capítulos de "Ulysses", em que a história da prosa em língua inglesa é percorrida por meio de pastiches, num assombroso tour-de-force.) Assim se vê que, para além de génio, Joyce tinha um pouco de profeta, o que se coaduna com o seu estatuto de exilado crónico. Recomendo vivamente a consulta desta página, onde estão recenseadas algumas das preferências e aversões literárias de Joyce. Há também uma passagem de "A Portrait of the Artist as a Young Man" em que o jovem Stephen Dedalus é forçado a revelar que Newman e Byron são os seus prosadores e poetas favoritos, o que atrai a animosidade de dois colegas seus, admiradores de Tennyson.
A SUA ZONA JÁ TEM UM INTELECTUAL?: Chegou-me às mãos o primeiro número de uma revistazita de divulgação da actividade cultural e comercial da área das Avenidas Novas (Lisboa). Logo na página 4, anuncia-se um Ciclo de Cinema e Cultura ao Pequeno-Almoço, com arranque previsto para dia 15 de Outubro. Nesse dia, de acordo com o programa, "Intelectual da zona faz um comentário sobre cinema". Ignoro o que seja um intelectual da zona, mas a expressão sugere-me algo de manhoso e mais do que vagamente ilícito, a meio caminho entre "dealer" e simples pária tolerado. Declaro que valeu a pena ter folheado esta publicação, quanto mais não seja pela entrevista a Gérard Castello Lopes, a propósito da tertúlia do "Vá-Vá" (Fernando Lopes, Paulo Rocha, José Fonseca e Costa, João César Monteiro, Seixas Santos...). Morei, durante dois anos e meio, a cerca de três minutos a pé do "Vá-Vá" (sem contar os tempos de espera nos semáforos), sem nunca lá ter posto os pés. É por estas e por outras que sinto por vezes vontade de escrever "Cinéfilo preguiçoso" nos meus cartões de visita.
O REPUBLICANO QUE HÁ DENTRO DE CADA UM NÓS ÀS VEZES PÕE-SE A ESPERNEAR!: É algo que faz bem ao coração, constatar como é o dilatado o número de personalidades, de tão notável gabarito, que, de repente, se descobriram convictos adeptos do reforço dos poderes presidenciais, e de um semi-presidencialismo com tendência para largar o "semi", como se de um atavio incómo se tratasse, demasiado abafado para os tempos de tórrida crise que se avizinham. Com o aproximar do momento em que o povo soberano, nos moldes consagrados pela Constituição, elegerá o magistrado supremo da República, por sufrágio directo e universal, existe como que um entusiasmo renovado em torno da figura do presidente, e um vivo e são desejo de consolidar as suas competências. E não me venham agora uns quantos maledicentes insinuar que este afã, consubstanciado em numerosos artigos de opinião recentes, se deve unicamente ao calculismo interesseiro e oportunista de quem já antecipa um resultado favorável para as eleições, e que, deste modo, cederia ao pecadilho de preconizar soluções concretas e ad hominem sem parecer deixar o plano abstracto. Não! Nós acreditamos que este frémito traduz um sentimento genuíno, expresso de maneira espontânea, longinquamente apadrinhado por Gambetta, Afonso Costa, e, porque não, Montesquieu!

quarta-feira, outubro 19, 2005

A (MAGRA) COLHEITA DA FESTA DO CINEMA FRANCÊS: Este ano não vi mais do que três filmes... Este ano vi apenas três filmes... Não vi mais do que... Foram apenas três os filmes que... Não foram mais de três... Na Festa do Cinema Francês deste ano... Foram apenas em número de três... Fiquei-me por três filmes... A minha contabilidade pessoal... Ficou-se pelos três filmes... Fiquei-me por apenas três filmes, na Festa do Cinema Francês deste ano. Tão somítica colheita ter-se-á devido ao menor interesse (na minha humilde opinião) da selecção deste ano, quando comparada com anos passados, mas também, inevitavelmente, aos habituais constrangimentos de tempo e ânimo. Um factor adicional de desencorajamento foi a marcação de grande parte das sessões do programa lisboeta para o Instituto Franco-Português, cujo auditório, de dimensões reduzidas, não me parece minimamente capacitado para receber este tipo de iniciativa; acrescente-se ainda a isto tudo um horário absurdo (a última sessão, das 21h30, começava apenas duas horas após o início da anterior, fomentando a confusão e aglomerações entre um filme e o seguinte, e inviabilizando as pausas prandiais que não são despiciendas para a fruição cinéfila). Falando dos filmes que vi, o balanço pode fazer-se recorrendo somente a três substantivos: revelação, desilusão e confirmação. Pela revelação foi responsável Lucile Hadzihalilovic, ex-assistente de Gaspar Noé (o realizador de "Irréversible"), que assina com "Innocence", inspirado numa obra de Wedekind, uma intrigante primeira longa-metragem. Passado quase integralmente numa misteriosa escola de meninas, pautada por complexos rituais e por uma autarcia quase absoluta, este filme impressiona pela maneira como manipula uma simbologia directa e forte, assumindo-se deliberadamente como metáfora, mas sem se deixar cristalizar nesse estatuto, antes mantendo a porta aberta a uma multiplicidade de leituras. Uma realizadora a seguir. Com "Les Mots Bleus", Alain Corneau demonstra eloquentemente os riscos a que se expõe um realizador cujo principal talento se resume a adaptar, com a inspiração do momento, e um quanto baste de sensibilidade e bom gosto, obras literárias pré-existentes. Depois de um magnífico "Tous les Matins du Monde" e de um muito conseguido "Stupeur et Tremblements", Corneau assinou agora uma obra medíocre, sem o respaldo literário de Pascal Quignard ou Amélie Nothomb (desconheço por completo Dominique Mainard, em cujo livro de baseou o argumento de "Les Mots Bleus"). Esquemas psicologistas estafados, com desfecho previsível e pleno de pathos pré-fabricado, são, aqui, o prato forte, e o cabotinismo de Sergi Lopez ajuda sobremaneira à indigestão. Nem Sylvie Testud (uma das minhas actrizes francesas favoritas, pelo menos desde "La Captive" de Chantal Akerman) salva este filme, que parece querer demonstrar que a exibição das fragilidades humanas, devidamente lastradas pelos inevitáveis traumatismos de infância, chegam para compor uma obra artística válida. Sem o conseguir minimamente. Sobre o sumptuoso "Rois et Reine", de Arnaud Desplechin, pouco escreverei agora, por duas razões: porque se trata de um filme que não se presta a que sobre ele se escreva em cima do acontecimento (demasiado complexo, demasiado original, demasiado desconcertante), e porque a sua estreia está anunciada para breve pela Atalanta, o que me permitirá a ele voltar numa ocasião oportuna, quando mais pessoas o tiverem apreciado. Limito-me a dizer que Arnaud Desplechin reafirma, de forma inequívoca, o seu estatuto de cineasta mais empolgante e inventivo da sua geração. É sempre algo de maravilhoso, quando um criador cuja obra amamos atravessa uma fase em que ao talento se vem juntar a consciência plena desse mesmo talento, e a vontade de o explorar, sem excluir nem o virtuosismo celebratório nem o sentido da responsabilidade perante a arte que pratica. Creio que é precisamente nesse ponto que se encontra Desplechin.

terça-feira, outubro 18, 2005

PERGUNTAS SOBRE VIENA À ESPERA DE RESPOSTA (9/10): Na loja do museu Albertina, estava à venda uma caneca com uma imagem representando um famoso auto-retrato de Vincent van Gogh. A caneca possuía a particularidade de a orelha do artista desaparecer quando nela se vertia um líquido quente. Ora bem, a minha pergunta à espera de resposta é a seguinte: Has the world changed or have I changed? (The Smiths) (Nesta mesma linha, aqui, podem igualmente adquirir o St. Sebastian Pin Cushion - "for your favorite martyr".)
POPULISMOS: No seu espaço do jornal "Público" do passado dia 13, Pacheco Pereira enumera os três candidatos às autárquicas que, no seu entender, «fundaram a sua campanha quase exclusivamente num apelo populista sem freios». Os fautores de tamanho despautério são: Fátima Felgueiras, Valentim Loureiro e... Francisco Louçã. O mais decepcionante aqui nem é a falta de discernimento com que este comentador coloca tudo no mesmo saco, aparentemente apostado em testar os limites da credulidade dos seus leitores. Consternante mesmo é verificar que, um pouco mais adiante, PP menciona um "sistema" que teria sido responsável por uma campanha de ataque, dirigida contra Rui Rio, vinda de jornalistas do Porto. Tal "sistema" agregaria «todos os agentes comunicacionais, jornalistas, "artistas", meios da cultura subsidiada, intelectuais, instituições.» Sublinho, nesta curta citação: por um lado a palavra "todos", cujo emprego tem o mérito de deixar bem vincado que ninguém pode reivindicar estar fora deste tenebroso "sistema"; por outro lado, o preciosismo das aspas que envolvem a palavra "artistas", deixando pairar a dúvida sobre quais as individualidades da cultura tripeira (inevitavelmente fervorosos apoiantes de Rio) a quem o qualificativo seria aplicável com uma legitimidade que dispensasse esse sinal de pontuação. Ou seja: poucas linhas depois de condenar os populismos de toda a espécie, PP cede a uma das mais serôdias e repisadas formas desse mesmo populismo, ao evocar o fantasma de uma minoria elitista, composta por intelectuais, pela comunicação social e por asquerosos "artistas" enriquecidos à custa dos ovos de ouro do erário público, todos em flagrante delito de conspiração contra o esforçado candidato (inequivocamente apoiado, depreende-se facilmente, pela "maioria silenciosa", pelo "bom povo" decente e trabalhador, que não pode deixar de nutrir justo rancor e ressentimento pela tribo de bem pensantes que povoa as redacções dos jornais). Por momentos, julguei escutar ecos da diatribe inflamada de Fátima Felgueiras, na noite da vitória eleitoral, contra os comentadores e jornalistas que ousaram opinar contra ela ao arrepio da vontade maciça dos honestos felgueirenses.
LEITURAS: "Le Cousin Pons", de Honoré de Balzac. «Le moment exige que je fasse deux ou trois œuvres capitales qui renversent les faux dieux de cette littérature bâtarde, et qui prouveront que je suis plus jeune, plus frais, et plus grand que jamais» escreveu Balzac, numa carta a Madame Hanska. O momento é 1847, e os "falsos deuses" são, verosimilmente, os autores de folhetins de sucesso como Eugène Sue ("Les Mystères de Paris"). E uma das obras capitais que Balzac se sente compelido a escrever, neste seu crepúsculo de carreira, será "Le Cousin Pons". Poucas terão sido as novidades, de conteúdo ou de forma, que este romance trouxe à "Comédia Humana". Pode-se dizer que "Le Cousin Pons" é a obra de um homem tocado pelo despeito, movido pela urgência de mostrar aos outros e a si mesmo que ainda é capaz das mesmas proezas de antigamente, e de pôr cobro a um período de esterilidade (coincidente com os seus trajectos pela Europa em busca da felicidade conjugal) de uma forma categórica, de preferência não isenta de estrondo e sensação. As traves-mestras de "Le Cousin Pons" tinham já ajudado a sustentar porções importantes do edifício da "Comédia": o arrivismo, a cupidez como sentimento transversal a todos os estratos da sociedade, o coleccionismo, o amor pela Arte como indutor de comportamentos bizarros e potenciadores da desgraça, a linguagem da Lei como armadilha e arma retórica à disposição dos perversos. Balzac actua, sem pudor, como um mestre de cerimónias, que faz intervir os diferentes elementos e personagens com um sentido de oportunidade que, ao mesmo tempo, lhes pertence e serve a narrativa. Como se o próprio autor se perfilasse lado a lado com os facínoras que arquitectam a perdição de Pons e a usurpação da sua herança de quadros valiosos. Pons, velho músico solteirão de fealdade inaudita, doentiamente apaixonado pela sua pinacoteca pessoal, viciado nos prazeres da gastronomia, é uma das mais ricas criações da derradeira fase do período de Balzac. Alma sensível entre empedernidos, o seu trágico fim, neste romance negro em que o Mal triunfa em toda a linha, assemelha-se demasiado a um sacrifício no altar do talento do autor. Raras vezes Balzac terá ido tão longe na sondagem do cinismo humano. A três anos da morte do romancista, a corrupção do seu semelhante afirma-se, em definitivo, como fulcro da sua diabólica máquina romanesca.

sábado, outubro 15, 2005

LEITURAS: No romance "Le Cousin Pons", de Balzac, Schmucke, músico alemão residente em Paris, sofre um cruel desgosto com o falecimento do seu amigo Pons. A única personagem que não alberga dúvidas sobre a sinceridade da dor de Schmucke (designado herdeiro universal por Pons, que era possuidor de uma colecção de arte de valor incalculável) é o mestre de cerimónias das pompas fúnebres: «Le maître des cérémonies regarda Schmucke d'un air de pitié, car cet expert en douleur distinguait bien le vrai du faux(...)»
XADREZ: Tal como se esperava, Veselin Topalov, da Bulgária, sagrou-se campeão do mundo da Federação Internacional de Xadrez (FIDE), ao terminar com um ponto e meio de vantagem sobre os mais directos perseguidores, no torneio realizado em San Luis, Argentina. (Ver aqui, o relato relativo à última jornada, e, aqui, a página oficial do campeonato do mundo.) Topalov culmina assim um ciclo fabuloso de grandes resultados, sagrando-se campeão com todo o merecimento. O seu início foi fulgurante (seis vitórias e um empate). A meio do torneio, a sua performance era sobre-humana. Na segunda metade, Topalov geriu a sua vantagem com inteligência, acumulando os empates. No entanto, é de salientar que Topalov só esporadicamente se permitiu daqueles empates curtos e sensaborões de que abusam tantos grandes-mestres. O seu espírito combativo raramente o abandonou. Acompanharam Topalov no pódio o indiano Vyswanathan Anand e o russo Peter Svidler. Para além destes, o russo Aleksandr Morozevich e o uzbeque Rustam Kasimdzhanov (o ex-campeão agora destronado) podem estar relativamente satisfeitos com a sua actuação. Em contrapartida, o torneio foi um rotundo fracasso para o húngaro Péter Lékó (apontado como um dos grandes favoritos, e que não passou de quinto), para o inglês Michael Adams, e para a húngara Judit Polgár, única mulher presente. A FIDE dispõe agora de um campeão inequívoco e incontestável, que não deixará de apresentar como trunfo em eventuais negociações com o campeão do mundo oficioso (o russo Vladimir Kramnik), com vista a uma reunificação dos títulos. Estou curioso em acompanhar a evolução dos acontecimentos. (Para aqueles que se interessam por estas coisas, ou que sentem nem que seja um grãozinho de curiosidade para saber os extremos de paixão e de retórica que se atingem quando se discute "quem é o verdadeiro campeão do mundo de xadrez", aconselho esta longa linha de comentários no blog de Mig Greengard.)

quinta-feira, outubro 13, 2005

MISSÃO: RECUPERAÇÃO DO TEMPO PERDIDO (2): Goradas que foram as boas intenções de apresentar, um a um, os candidatos ao título de campeão do mundo de xadrez, resta-me anunciar que o búlgaro Veselin Topalov está prestes a levar a melhor sobre os seus adversários, no torneio que decorre em San Luis, Argentina. A duas rondas do final, Topalov dispõe de 1,5 pontos de avanço sobre os perseguidores mais próximos (relembro que, em xadrez, uma vitória vale um ponto, e o empate meio ponto). Tudo ficará decidido nos próximos dois dias. Se Topalov triunfar, como tudo parece indicar, verificar-se-á uma situação curiosa: a Bulgária deterá o monopólio sobre os títulos mundiais de xadrez masculino, feminino e de veteranos.
MISSÃO: RECUPERAÇÃO DO TEMPO PERDIDO (1): O blog Seta Despedida cumpriu 2 anos no passado dia 25. Quanto representam 2 anos em anos de blog? Pelo menos uns 100 ou 200, estimo eu, atendendo à enorme quantidade daqueles que entregaram a virtual alma ao criador em menos de um périplo terrestre. E, com efeito, estes últimos 2 anos parecem-me ter contido várias vidas.
MISSÃO: RECUPERAÇÃO DO TEMPO PERDIDO (0): No decurso desta paragem, que motivos imprevistos prolongaram para lá do inicialmente esperado, houve vários acontecimentos que foram passados em claro. Tentaremos repescar alguns daqueles a que o colectivo, na sua imensa sabedoria (aqui no 1bsk pratica-se a democracia directa), atribuiu pertinência e importância mais graúdas. É forte a tentação de parafrasear Yourcenar: O Tempo, esse grande Estafermo.
GENEALOGIA: Este blog equivale a um (desnecessário) cruzamento entre o (meio) minuto de silêncio de Anna Karina, Sami Frey e Claude Brasseur em "Bande à Part", de Godard, e o grito de Michael Lonsdale em "India Song", de Duras.