Na linha verde do metropolitano, no meio de um aglomerado denso de consultadores compulsivos de telemóveis, uma leitora lia "Os Irmãos Karamazovs".
Não quero ser preconceituoso. Admito que alguns deles estivessem a ler clássicos russos nos seus ecrãs minúsculos. Mas tenho as minhas dúvidas.
quarta-feira, julho 19, 2017
sexta-feira, julho 14, 2017
14 do 7
Detesto a violência, mas não acredito que o progresso social e a
conquista dos direitos humanos possam, historicamente, ser alcançados
apenas por meio do consenso entre pessoas de bem e por meio de evoluções
graduais e pacíficas. Edmund Burke acreditava nisso; muitos dos seus
seguidores hodiernos, menos subtilmente mas mais insidiosamente, também
acreditam. Gostaria que as rupturas que fizeram da história europeia do
século XIX um tortuoso caminho em direcção a um mundo um pouco mais
suportável tivessem ocorrido sem derramamento de sangue. Nem sempre é
verdade que "só a violência ajuda onde a violência impera" (Brecht), mas
frequentemente é assim. Viva o 14 de Julho!
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"La Marseillaise" (Jean Renoir, 1938). Retirado daqui. |
sábado, julho 08, 2017
terça-feira, junho 20, 2017
terça-feira, abril 25, 2017
domingo, janeiro 15, 2017
Houve um dia em que o mundo tentou entrar, quando um empreiteiro bateu à porta e avisou de que o proprietário gostaria de trocar a janela por uma moderna com vidros grandes que deixariam entrar mais luz e menos frio e com a qual eu seria muito mais feliz. Ainda ele falava e já eu tinha fechado a porta.
(Daniel Blaufuks, texto de apresentação da exposição "Tentativa de esgotamento")
(Daniel Blaufuks, texto de apresentação da exposição "Tentativa de esgotamento")
quarta-feira, janeiro 04, 2017
domingo, janeiro 01, 2017
sexta-feira, dezembro 30, 2016
quinta-feira, dezembro 29, 2016
LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS
No Alfa Pendular, entre Porto e Lisboa, um leitor lia "Finisterra", de Carlos de Oliveira.
Há lá melhor lugar e circunstâncias para pôr em dia a leitura dos clássicos portugueses do século XX do que sobre carris, a 200 quilómetros por hora?
Há lá melhor lugar e circunstâncias para pôr em dia a leitura dos clássicos portugueses do século XX do que sobre carris, a 200 quilómetros por hora?
domingo, novembro 13, 2016
domingo, outubro 23, 2016
LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS
No comboio Porto-Aveiro, uma leitora folheou "Espaço do Invisível 3", de Vergílio Ferreira, antes de o guardar na mala e começar a ler outro livro, que não consegui identificar.
domingo, outubro 16, 2016
SETSUKO HARA (1920-2015)
(Obituário escrito por mim e publicado originalmente na revista LER.)
A actriz Setsuko Hara (1920-2015), que desapareceu a 5 de Setembro [de 2015] (o anúncio surgiu mais de dois meses depois), participou pela última vez num filme em 1962, mas perdurou na memória dos cinéfilos graças sobretudo aos filmes que Yasujiro Ozu realizou entre 1949 e 1961. Nestes, a sua personagem é quase sempre uma mulher inteligente, sensata e activa, mas condicionada por conflitos entre gerações ou por situações familiares complexas. Representar personagens positivas e gentis pode ser uma vantagem aos olhos da posteridade, mas a explicação para o facto de Hara ser tão recordada e chorada mais de meio século depois da sua última aparição não se pode resumir a isso. Como escreveu Miguel Esteves Cardoso, a propósito da literatura: não basta escrever bem sobre coisas belas e moralmente defensáveis: convém também ser-se boa pessoa. Hara pertencia àquele rarefeito conjunto de actrizes que dão corpo a personagens plenas de uma humanidade sereníssima e que o fazem esplendidamente (porque é também de um talento assombroso que se está aqui a falar). Quanto à pessoa, essa remeteu-se à reclusão quando abandonou o cinema, mas deixou atrás de si uma presença humana que transcende os filmes e os anos e que condensa toda a decência, doçura e verticalidade que o cruel século XX teve para oferecer. Setsuko Hara foi a amiga, a irmã, a filha, a mãe, a mulher e a amante que todos julgamos, muito lá no fundo, poder vir a merecer. Os minutos finais de Viagem a Tóquio (1953), e em particular a cena em que Hara e o (também imenso) Chishu Ryu, de três quartos, parecem trespassados pelos cabos eléctricos omnipresentes nos filmes de Ozu, são momentos em que se percebe que o cinema é afinal uma maneira de tocarmos e olharmos de frente esse estranho fenómeno que se chama estar vivo no mundo.
A actriz Setsuko Hara (1920-2015), que desapareceu a 5 de Setembro [de 2015] (o anúncio surgiu mais de dois meses depois), participou pela última vez num filme em 1962, mas perdurou na memória dos cinéfilos graças sobretudo aos filmes que Yasujiro Ozu realizou entre 1949 e 1961. Nestes, a sua personagem é quase sempre uma mulher inteligente, sensata e activa, mas condicionada por conflitos entre gerações ou por situações familiares complexas. Representar personagens positivas e gentis pode ser uma vantagem aos olhos da posteridade, mas a explicação para o facto de Hara ser tão recordada e chorada mais de meio século depois da sua última aparição não se pode resumir a isso. Como escreveu Miguel Esteves Cardoso, a propósito da literatura: não basta escrever bem sobre coisas belas e moralmente defensáveis: convém também ser-se boa pessoa. Hara pertencia àquele rarefeito conjunto de actrizes que dão corpo a personagens plenas de uma humanidade sereníssima e que o fazem esplendidamente (porque é também de um talento assombroso que se está aqui a falar). Quanto à pessoa, essa remeteu-se à reclusão quando abandonou o cinema, mas deixou atrás de si uma presença humana que transcende os filmes e os anos e que condensa toda a decência, doçura e verticalidade que o cruel século XX teve para oferecer. Setsuko Hara foi a amiga, a irmã, a filha, a mãe, a mulher e a amante que todos julgamos, muito lá no fundo, poder vir a merecer. Os minutos finais de Viagem a Tóquio (1953), e em particular a cena em que Hara e o (também imenso) Chishu Ryu, de três quartos, parecem trespassados pelos cabos eléctricos omnipresentes nos filmes de Ozu, são momentos em que se percebe que o cinema é afinal uma maneira de tocarmos e olharmos de frente esse estranho fenómeno que se chama estar vivo no mundo.
terça-feira, outubro 11, 2016
OFÍCIO
Os poemas que não fiz não os fiz porque estava
dando ao meu corpo aquela espécie de alma
que não pôde a poesia nunca dar-lhe
Os poemas que fiz só os fiz porque estava
pedindo ao corpo aquela espécie de alma
que somente a poesia pode dar-lhe
Assim devolve o corpo a poesia
que se confunde com o duro sopro
de quem está vivo e às vezes não respira
(Gastão Cruz, "Escarpas", Assírio & Alvim, 2010)
Os poemas que não fiz não os fiz porque estava
dando ao meu corpo aquela espécie de alma
que não pôde a poesia nunca dar-lhe
Os poemas que fiz só os fiz porque estava
pedindo ao corpo aquela espécie de alma
que somente a poesia pode dar-lhe
Assim devolve o corpo a poesia
que se confunde com o duro sopro
de quem está vivo e às vezes não respira
(Gastão Cruz, "Escarpas", Assírio & Alvim, 2010)
quarta-feira, outubro 05, 2016
5 DE OUTUBRO
O 5 de Outubro de 2016 possui um sabor especial porque é a primeira vez que a data é celebrada com feriado nacional, como deve ser, depois do período negro durante o qual este e outros três feriados estiveram abolidos. Esse acto vergonhoso não deverá ser jamais esquecido. Porém, o que importa hoje é recordar e homenagear os heróis que, precisamente há 106
anos, puseram fim a quase oito séculos de reis, reizinhos, dinastias e
crises sucessórias e lançaram as fundações do Portugal moderno. Viva a
República!
segunda-feira, setembro 26, 2016
TANIZAKI E MELOPEIA
Talvez Manuel da Silva Ramos nunca venha a fazer parte dos meus duzentos autores portugueses favoritos; problema meu e só meu, bem entendido. Mas como não cobrir de indulgências alguém que diz de uma prostituta brasileira que podia ter saído de um romance do Tanizaki, e que intitula um dos seus contos "Melopeia sintrense com direito a sonho e pausa musical entendida como copulação sonâmbula vertical"? (A propósito de "Perfumes eróticos em tempos de vacas magras", Parsifal, 2014.)
sábado, setembro 17, 2016
segunda-feira, setembro 05, 2016
OH LA LA LOLITA
Em pleno zapping, chego ao canal "Arte" e constato que estão a passar "Lolita", de Kubrick. Não me falta vontade de ficar a ver pelo menos uns minutos, mas eis que descubro tratar-se de uma versão dobrada. O meu dedo carrega no botão do telecomando com uma prontidão proporcional à falta de vontade de ver um actor genial como Peter Sellers debitar um monólogo em francês postiço.
Agradeço ao Destino ter-me feito nascer num país pobretanas onde não há dinheiro para dobrar filmes.
Agradeço ao Destino ter-me feito nascer num país pobretanas onde não há dinheiro para dobrar filmes.
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