terça-feira, fevereiro 17, 2009

UM HOMEM DE "PRINCÍPIOS ELEVADOS" E O SEU DEVOTO SIDEKICK: Num mundo que gosta de se anunciar sem preconceitos e repudia a censura, existe um bloqueio drástico sobre o Holocausto. Comentar o horror nazi não pode ser feito fora da versão oficial. São admitidas todas as opiniões, menos essa. Quem escreveu estas palavras? Se o leitor se atreveu a um palpite, e se esse palpite foi "Mahmoud Ahmadinejad", ninguém o pode censurar. A plausibilidade está do seu lado. Sucede, contudo, que estas frases saíram da pena, sempre fecunda, de João César das Neves, o nosso cronista preferido das segundas-feiras, e foram extraídas de um artigo onde ele arrasa todos aqueles que, cedendo ao flagelo do politicamente correcto, criticaram Joseph Ratzinger por ter levantado a excomunhão aos quatro bispos da Sociedade S. Pio X, ordenados por Marcel Lefebvre (incluindo o negacionista Richard Williamson). Na sua ingenuidade, ou na sua má-fé (o efeito é idêntico), JCN atribui ao negacionismo o estatuto de historiografia. O mundo que JCN habita está povoado por historiadores que, cheios de sinceridade e honestidade, contestam o extermínio dos judeus pela máquina nazi da mesma forma que, se o vento tivesse soprado para esse lado, poderiam contestar a existência da escola de Sagres ou a descoberta do Brasil por Álvares Cabral em 1500. Um tema como qualquer outro. Estaria na altura de alguma alma caridosa pagar um TriNaranjus a JCN num bar qualquer, e aproveitar a ocasião para lhe dizer que, neste nosso mundo, o mundo real em que vivemos todos, os negacionistas não são historiadores sérios. São anti-semitas, frequentemente conotados com organizações airosas e simpáticas como a Frente Nacional de Le Pen. Não estão a fazer investigação histórica, mas sim a debitar agit-prop, em doses sabiamente controladas, perfeitamente cientes da margem de manobra que possuem nas sociedades de hoje. E contando, claro está, com a candura de opinantes como João César das Neves. Se estes agentes provocadores se dedicassem a tentar provar que Napoleão morreu em Waterloo, e que a criatura que penou em Santa Helena foi um mero sósia, não recolheriam mais do que escárnio e indiferença. Ao defenderem que as câmaras de gás dos campos de concentração eram usadas apenas para desinfecção, ou outras inanidades do mesmo jaez, sabem que estão a tocar numa ferida ainda aberta. Muito pessoalmente, ignoro por completo as subtilezas da lei canónica, e o real significado de uma excomunhão. Mais do que a excomunhão em si, acho sintomática a intenção, expressa pelo Vaticano, de promover a reconciliação com uma sociedade que faz a apologia da Inquisição e do regime de Vichy, e exprime as opiniões mais retrógradas e tacanhas sobre um sem-número de assuntos, desde a apostasia e o concílio de Trento até considerações sobre se é ou não pecaminoso tocar música folk para ganhar a vida. (Ver aqui, aqui, e aqui, por exemplo.) Nada do que sai da Basílica de São Pedro é inocente, e esta foi mais uma achega para definir um pontificado cujas cores, ao fim de quase quatro anos, são nítidas para todos, para júbilo de alguns aficionados versão pós-Vaticano II.

quinta-feira, fevereiro 12, 2009

LEITOR PREGUIÇOSO, MEU SEMELHANTE, MEU IRMÃO: Após mais de 300 páginas de "Boa Tarde às Coisas Aqui em Baixo", de António Lobo Antunes, ainda não descobri o que é um "mabeco", nem me dei ao trabalho de averiguar. Receio que isto me afaste irremediavelmente do modelo de leitor ideal.

segunda-feira, fevereiro 09, 2009

O QUE FAZ FALTA: A língua portuguesa não é suficientemente concisa. Faz-nos falta um verbo que signifique "estar frente à entrada dos Armazéns do Chiado, em grupo ou sozinho/a, parado, sem fazer nada, perturbando aqueles que tentam entrar para ir à Fnac ver as novidades na secção dos DVDs".
CANONIZAÇÃO?: Não sei se se pode falar em canonização, mas o que é certo (e basta folhear os "Cahiers" para disso nos certificarmos) é que não falta por aí malta rendida a "The Curious Case of Benjamin Button", e que não regateia o certificado de obra-prima. Seja. Opiniões alheias assinadas por mãos que eu respeito podem fazer-me repensar as minhas apreciações, mas o filme de Fincher contém tanto daquilo que eu mais detesto em cinema (complacência, falsa ousadia formal, cedência descarada a lugares-comuns) que rever o veredicto não está nos meus planos. Quanto à constatação de que a Academia nomeou para 13 óscares (TM, ©, e tudo o resto) este filme indigesto e insignificante, vergado pela própria pompa sentimental, pelos papagueios morais e pela saturação de efeitos visuais, e que ignorou o subtil e perturbador "Zodiac", isso transmite-me uma sensação reconfortante. Premiar a mediocridade e votar ao desdém a ousadia faz parte das boas tradições de Hollywood. Inquietante e ominoso seria que, subitamente, estes saudáveis hábitos fossem ameaçados por uma qualquer brisa de clarividência.

domingo, fevereiro 08, 2009

OUTRA PARA QUEM A APANHAR: Na quinta-feira tive o privilégio de viver uma autêntica soirée temática. A soirée começou na Fnac, com o lançamento do livro "Os Ventos e Outros Contos" de Eudora Welty (tradução de Diana Almeida, edição Antígona), a que não pude assistir até ao fim devido ao início iminente do evento seguinte, o filme "Antígona" (Sófocles/Hölderlin/Brecht, esse mesmo), da imbatível parelha Huillet/Straub, na Cinemateca. Só faltou mesmo assistir à "Antígona Gelada", mas quando se fala em mitos gregos transpostos para satélites de Plutão estamos a falar em territórios que não me sinto tentado a desbravar.

segunda-feira, fevereiro 02, 2009

ESCUTADO NA RUA:
  • "Eu não tenho vergonha! As salsichas tinham bolor!"
  • "Trabalhar com essa casa não resulta, nunca resultou e nunca resultará."
  • "Quando eu estou online o bacano também está online."

(Esta última frase dizia provavelmente respeito ao Prof. Cavaco Silva.)