quinta-feira, novembro 25, 2010

MAIS PÉROLAS DA "PARIS REVIEW": Segundo a nota biográfica no final do 2º volume das entrevistas da "Paris Review", William Gaddis foi expulso de Harvard «on account of an incident of rowdiness». Da entrevista, contudo, não parece transparecer qualquer animosidade dirigida contra o sistema educativo: INTERVIEWER: Your satire concerning education is quite passionate. You must have had bad experiences. WILLIAM GADDIS: No, really the opposite, in fact. I went to boarding school in New England when I was very young, and to college at Harvard, and had a good education. ("The Paris Review Interviews, vol.2")

terça-feira, novembro 23, 2010

DA DIFERENÇA ENTRE HISTORIADORES E HISTORIADORES DE DOMINGO: «Sei que há uma grande tendência hoje para comparar de forma simplista o regime da I República com o Estado Novo, nomeadamente a nível da repressão. Aliás, há mesmo quem diga que a repressão política na I República foi superior à que se assistiu na ditadura salazarista. Em comum nestas comparações, a meu ver erradas, há um esquecimento importante, provavelmente ligado a desconhecimento de factos, que acaba por falsificar a realidade histórica.» (Irene Pimentel, who knows enough about it.)
PLEC = PROCESSO DE LEITURA EM CURSO:
O centenário do 5 de Outubro serviu de prova em como os historiadores de domingo são legião. No meio da floresta virgem de asserções delirantes sobre a 1ª República (claramente a fase mais negra da história portuguesa desde a traição a Viriato, segundo alguns espíritos valorosos e de pena caudalosa), sabe bem encontrar uma clareira de bom senso e rigor científico.

quinta-feira, novembro 11, 2010

LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS: Uma leitora lia "A Baía dos Anjos", de Anita Brookner. Tudo se passou -salvo monumental traição da memória - na linha verde do metropolitano
MANUEL CINTRA FERREIRA: Nunca o conheci pessoalmente, mas parece-me impossível gostar de cinema em Portugal, nestas décadas entre um milénio e o seguinte, sem ter convivido de perto com a escrita de Manuel Cintra Ferreira, com a sua insuperável erudição cinéfila, com o seu tão visível amor pelos filmes. Foi muito o que aprendi lendo as críticas dos "quatro magníficos" que, nos anos 80 e 90 (não me recordo do período exacto), faziam da crítica de cinema um exercício de inteligência e de paixão, nas páginas do "Expresso": Manuel Cintra Ferreira, Eduardo Prado Coelho, Jorge Leitão Ramos e João Lopes. De Manuel Cintra Ferreira, guardo dezenas de folhas da cinemateca, soltas ou compiladas; outras tantas pequenas lições de história do cinema, discretas apologias de uma arte que se quer dotada de memória. Ele vai fazer-nos falta.

terça-feira, novembro 02, 2010

LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS: Na linha verde do metropolitano, um leitor lia "A Tale of Two Cities". O facto de se tratar da versão original, e de estar de pé, dá direito a 40 pontos de bónus, como não o ignoram os seguidores fiéis desta rubrica, tão numerosos que já justificavam uma flash mob.
TAMBÉM QUERO: Eu também quero ter um mandatário digital.

segunda-feira, novembro 01, 2010

PLEC = PROCESSO DE LEITURA EM CURSO: Aquela que se pode designar como a personagem principal de "Le Mauvais Lieu", de Julien Green (1977), é Louise, uma órfã pré-adolescente que vive com a tia. Rapidamente se torna claro que Louise funciona como receptáculo e ecrã para os desejos, pulsões e frustrações dos que a rodeiam. Ao longo da totalidade do romance, assiste-se ao aniquilamento de Louise como personagem e à sua ascensão ao patamar de símbolo da inocência em risco de ser conspurcada, e neste processo o autor demonstra uma perversidade, no plano simbólico e subtextual, de que nem as mais vis de entre as suas personagens, confinadas ao texto e à existência burguesa, seriam capazes. Como estratagema literário - e é talvez isto que mais custa perdoar - é previsível, denunciado e ineficaz.
PLEC = PROCESSO DE LEITURA EM CURSO: Um grande, grande livro. Uma busca de felicidade na Londres do pós-WW2, guiada por um imperativo ético em registo semicómico: muito do que sucede à narradora, em termos pessoais e profissionais, decorre da sua obstinação em chamar "pisseur de copie" a um mau escritor protegido por uma autora influente e famosa. O excelente prefácio de Ali Smith elucida a subtileza e o profundo alcance moral deste romance, o décimo oitavo de Muriel Spark, publicado em 1988. "A Far Cry From Kensington" narra uma odisseia da autonomia do espírito e da coragem. A felicidade não surge como um prémio, tão pouco como um caprichoso efeito colateral: antes, como uma radiosa faceta da ordem natural das coisas. O registo, falsamente menor e ligeiro, serve admiravelmente o enredo e a intenção da autora. A ostentação e o excesso de gravidade tê-lo-iam arruinado. Poucas vezes, nos últimos tempos, simpatizei tanto com uma personagem como com a Mrs. Hawkins que engendra esta história, no meio das suas noites de insónia.