sábado, novembro 30, 2013

LEITURAS EM LUGARES PÚBLICOS

Na inevitável linha verde do metropolitano: uma leitora lia "The Sense of an Ending", de Julian Barnes, e um leitor lia "A Origem da Tragédia", de Nietzsche (na edição da Guimarães). A distância que separava um do outro percorria-se em menos tempo do que leva a dizer "Deus está morto".

terça-feira, novembro 12, 2013

Ó CAVALHEIRO, NÃO QUER VIR DAR UM TIRINHO NA CONSTITUIÇÃO?

O exercício de zurzir na Constituição da República está a transformar-se num espectáculo de feira. Tal como numa barraca de tiros, os mais exímios acotovelam-se com os mais canhestros. Entre esta multidão que se chega à frente, com receio de perder a vez, como categorizar o ministro da Defesa, Aguiar-Branco?

 "A verdade é que nós, por via da situação de tender a ter esse Estado social absorvente, tender a ter um Estado que visa absorver a sociedade numa dimensão que, a meu ver é exagerada, faz com que tenhamos uma tentação de um Estado totalitário, que cria as promiscuidades, que cria as clientelas, que cria as dependências e enfraquece a sociedade", sustentou.

Justifica-se a hesitação. Ele não é particularmente certeiro, mas não é mais inábil do que qualquer um dos que o antecedeu ou virá a seguir. A haver um prémio da originalidade, Aguiar-Branco arriscava-se a levá-lo consigo. Agitar o espantalho da transformação do Estado Social num Estado totalitário, fazer dos mecanismos de apoio social (que tantas vezes fazem a diferença entre a miséria e a dignidade) tentáculos ameaçadores, acusar esse mesmo Estado de criar promiscuidades (quando salta à vista que as promiscuidades brotam na zona cinzenta entre Público e Privado, independentemente da dimensão dos respectivos sectores), revela uma ousadia que será difícil de igualar. Aguiar-Branco colocou esta nova actividade recreativa num patamar de sofisticação e fantasia inesperado. Resta saber se aqueles que seguem atrás dele na fila saberão mostrar-se à altura.

domingo, novembro 10, 2013

sexta-feira, novembro 08, 2013

O ESTADO, ESSE INIMIGO DOS POBRES

Há quem faça montanhismo ou corridas clandestinas de carros para obter o seu "fix" periódico de adrenalina. Outros recorrem a estratégias mais subtis. João César das Neves, por exemplo, parece confiar nos seus exercícios semanais de defesa do indefensável para sugar o tutano da existência, para se sentir vivo, audaz e completo.

Na sua última crónica, por exemplo, JCN sustenta que

todos sabem ser [o Estado] há séculos um inimigo dos miseráveis

E não se pense que o âmbito desta afirmação se confina aos tempos idos de Antigos Regimes, totalitários e absolutistas:

Reis, imperadores e governantes nunca se interessaram pelos desgraçados, quando não os perseguiam. O poder não gosta dos pobres e estes confiam mais na ajuda do próximo que nas promessas dos chefes. Há muito que é a Igreja, não o Governo, a tratar dos necessitados. As coisas parecem diferentes na moderna democracria assistencialista, mas um velho princípio económico mostra a ingenuidade dessa ilusão.

Esse "velho princípio" (foi postulado há cerca de meio século) é a lei de Director, atribuída a Aaron Director (figura de relevo da escola de Chicago, acessoriamente cunhado de Milton Friedman) e formulada por George Stigler:

Esse teorema afirma que "as despesas públicas são feitas para o benefício primordial da classe média, e financiadas com impostos suportados em parte considerável pelos pobres e pelos ricos".

JCN raramente hesita em puxar dos seus galões de professor de Economia para impressionar a populaça. Quantos dos seus leitores alguma vez terão ouvido falar desta lei? De entre os 99,99% que nunca ouviram falar dela (entre os quais me incluo), quantos se darão ao trabalho de tentar ir além das sentenças que JCN emite a partir da sua cátedra?

Uma rápida pesquisa na Internet permite descobrir algumas coisas interessantes que ajudam a injectar um pouco de contexto nesta crónica:

  • Trata-se de uma lei empírica, e não de um princípio universalmente aceite que justifique uma condenação tão categórica do papel do Estado junto dos mais desmunidos. Lendo JCN, dir-se-ia estarmos perante a 2ª lei de Newton.
  • Quase todos os "sites" que a citam são claramente conservadores e recorrem a esta lei como um recurso de contra-argumentação dirigido às políticas orçamentais da administração Obama.
  • A lei de Director diz apenas respeito à distribuição dos recursos por via de um orçamento e ao modo como esta é influenciada pelas alianças (no sentido lato do termo) que se formam entre sectores do eleitorado. Não abrange a vertente assistencialista típica de um Estado Social moderno (ver, neste artigo, o parágrafo 2.1), o que, logo à partida, deita por terra a comparação que JCN tenta estabelecer com a suposta generosidade da Igreja.


Mas o que importa isto tudo? A prioridade de JCN nunca foi a coerência com a realidade, mas sim viver perigosamente nas fronteiras selvagens do inverosímil e do mirabolante. Para quem já veio a terreiro defender que a Inquisição não passou de um clube de cavalheiros inofensivos, que a religião é amiga da ciência, que as causas do declínio da natalidade são a promoção da homossexualidade e a educação sexual laxista, isto certamente sabe a pouco. As próximas semanas hão certamente de nos trazer material mais "hardcore".

quinta-feira, novembro 07, 2013

quarta-feira, novembro 06, 2013